Estratégia adaptativa – agilidade competitiva em três movimentos

Estamos vivendo num tempo em que o mantra de que a mudança é a única constante se faz presente com toda força. Os ciclos econômicos entre períodos de prosperidade e estagnação ou recessão se aceleram, inovações tecnológicas possibilitam novas soluções com novos entrantes no mercado disputando espaço com empresas estabelecidas, movimentos sociais vão exigindo novas posturas das organizações, e assim por diante.

Nesse cenário socioeconômico, as empresas precisam encontrar formas de dar respostas rápidas, para adaptarem-se à nova dinâmica do mercado, se quiserem permanecer relevantes e competitivas. A visão de futuro de 3 a 5 anos ou mais, embora ainda um importante norteador do desenvolvimento da empresa e suas linhas de negócio, já não consegue impulsionar as mudanças necessárias. São mandatórios ciclos mais curtos de planejamento e ação, onde a referência temporal passa de anos para meses. Assim, entra em cena a estratégia ágil.

A sentença “Não é o mais forte que sobrevive, nem o mais inteligente, mas o que melhor se adapta às mudanças” (afirmação atribuída a Charles Darwin), transposta para o mundo empresarial, nunca foi tão verdadeira.

A expressão agilidade, embora tenha em si o senso de urgência, antes de rapidez deve ser entendida como adaptabilidade. Nessa linha alternativa de formulação estratégica, mais do que análises elaboradas considerando números, o poder de síntese, o entendimento do contexto e a tomada de decisão com menos informações se faz necessário.

Mas o que devemos esperar de uma estratégia ágil? Quais bases devem ser usadas na tomada de decisão, na escolha dos caminhos a seguir. Vamos tomar como referência o modelo dos 3 horizontes de crescimento, tecido pela consultoria McKinsey no final do século passado (ver artigo A Fórmula do Crescimento, 1999), a saber: [h1] ampliar e defender o negócio principal, [h2] criar negócios emergentes e [h3] ter opções viáveis. Segundo alguns gurus desta era de mudanças aceleradas por tecnologia, com startups (empresas embrionárias) e seu empreendedorismo de inovação, esse modelo está superado. Será?

Bem, se considerarmos que cada horizonte segue seu curso em uma evolução naturalmente sequenciada devemos concordar. Para se manter competitiva a organização não pode mais alinhar decisões e ações estratégicas em cadeia, contando que terá de 3 a 5 anos para fazer acontecer. Contudo, a questão que devemos considerar é que a proposta do modelo se mantém atual, e não necessariamente os 3 horizontes devem ser explorados em sequência. Nada impede que se tomem decisões e implementem iniciativas com ações simultâneas aos três horizontes.

Então, ajustando o modelo dos 3 horizontes para uma formulação estratégica ágil, podemos afirmar que a adaptabilidade competitiva será mais bem-sucedida ao se colocar em prática três movimentos estratégicos em paralelo: [m1] fortalecimento do negócio principal (core business), [m2] ampliação do portfólio de produtos (bens e/u serviços) e [m3] criação de novos espaços de mercado. Em termos gerais, são as seguintes as linhas da estratégia ágil para os três movimentos:

  • [m1] Fortalecendo o negócio principal – este movimento deve ser trabalhado em um horizonte de planejamento de uns 3 meses. Ele deve estar focado na revisão de diretrizes gerais, o posicionamento estratégico, a postura estratégica, e quais produtos de seu portfólio (em particular os geradores de caixa e os com potencial de crescimento de mercado) devem ser priorizados para entrega aos clientes atuais trabalhando-se na ampliação de seu valor percebido. Tudo isso sem perder de vista o propósito organizacional, seus valores, sua missão, e a visão de futuro (a de longo prazo).
  • [m2] Ampliando o portfólio de produtos – embora disparado simultaneamente ao movimento 1, aqui o prazo a ser considerado se estende até uns 6 meses. O foco das iniciativas estratégicas deve estar na oferta de soluções inovadoras, que passarão a compor o portfólio de produtos da empresa. A busca por essas soluções deve considerar potenciais clientes em mercados adjacentes, aqueles próximos ao seu core business, mas ainda não atendidos pela empresa.
  • [m3] Criando novos espaços de mercado – este terceiro movimento, concomitante aos outros dois, deve considerar um período de 9 meses a um máximo de 12 meses. Aqui se pode pensar em portfólio de negócios, com o desenvolvimento de uma nova unidade estratégica de negócio (UEN), procurando uma solução inovadora para clientes distantes de seu mercado alvo. Essa nova UEN deve ser pensada independentemente do core business, como um novo modelo de negócio com visão de futuro e direção próprias.

Um aspecto importante para o disparo dos movimentos 2 e 3 é a atenção aos cenários no entorno dos negócios da empresa. Uma boa prática é a busca por fatos portadores de futuro, procurando aqueles que poderão levar a um impacto significativo nos negócios da empresa. São pistas ou indicações de que alguma mudança no ambiente dos negócios pode estar em gestação ou mesmo em curso como, por ex., a tecnologia de redes móveis e banda larga 5G. Uma vez identificados esses germens de futuro, a empresa deve se antecipar as suas consequências com iniciativas estratégicas.

Destruição Criativa ou Espaços Inexplorados de Mercado

Publicado originalmente no LinkedIn

Com o fortalecimento do movimento do empreendedorismo de inovação, conduzido por startups, era esperado que surgissem novas teorias sobre modelos de negócio, estratégia, gestão, inovação e temas correlacionados. Isso faz parte do business de empresas de consultoria e capacitação profissional, com novos entrantes buscando se inserir no recém-criado espaço de mercado, aí incluídas atividades como mentoria, aconselhamento, palestras e afins.

É interessante notar que, na tentativa de dar tração às novas abordagens, alguns (ou muitos) dos novos entrantes partem para o ataque às teorias clássicas, métodos experimentados e validados, úteis quando aplicados no contexto apropriado. O curioso é que esses novos experts acabam por se referenciar em conceitos igualmente clássicos, como forma de justificar ou validar as novas teorias.

Assim, um dos conceitos que voltou aos holofotes é o da Destruição Criativa, cunhado pelo economista austríaco Joseph Schumpeter no final da primeira metade do século passado, pelo qual definiu o empreendedorismo como a introdução de novos produtos (bens ou serviços) na economia destruindo modelos de negócios estabelecidos. Esses novos produtos, dizia Schumpeter, constituem a força motriz do crescimento econômico sustentado. Um conceito, sem dúvida válido, revigorado pelos novos tempos de startups.

Essa definição – destruição criativa – por vezes tem sido usada para justificar uma prática recorrente nesse meio, a desqualificação de teorias, modelos e métodos clássicos. Mas, aprender, desenvolver e usar “novos truques” não implica esquecer os tradicionais ainda eficientes. E não é só, também tem sido usada como prova, pela minha percepção sem sustentação, de que os modelos de negócio do século passado já não se aplicam aos novos tempos. Será? É isso mesmo, a generalização faz sentido? A destruição criativa se dará em todos os segmentos da nova economia do empreendedorismo de inovação?

Antes de explicar meu ponto de vista, precisamos entender ainda outro conceito que tem sido deturpado, usado indiscriminadamente como sinônimo de inovação radical, o da disrupção. A inovação do tipo radical, da qual a disrupção é uma de suas formas, pode ser melhor entendida se subdividida em duas classes: de ruptura e disruptiva.

Inovações de ruptura implicam na quebra de paradigma, conforme definiu o físico e pesquisador Thomas Kuhn, pela qual são apresentadas soluções em geral mais elaboradas, por vezes complexas e/ou de maior custo num primeiro momento, que rompem com crenças enraizadas sobre como as coisas são ou funcionam. Por sua vez, as inovações disruptivas, termo criado pelo professor Clayton Christensen, partem de soluções mais simples, pela qual são oferecidos produtos (bens ou serviços) com tecnologia inferior e/ou funcionalidades básicas, em geral com preços mais acessíveis, para um público negligenciado pelas soluções existentes, e que acabam evoluindo e dominando o mercado das empresas até ali líderes.

Nessa linha de raciocínio, muitos no ecossistema do empreendedorismo de inovação têm afirmado que modelos de negócio disruptivos, originários de startups, tem promovido a destruição criativa das empresas estabelecidas então dominantes no mercado. Dentre os exemplos mais citados estão Amazon, Uber e Airbnb.

As alegações são que, a Amazon é a maior varejista do mundo sem ter uma enorme rede de lojas físicas, a Uber é a maior empresa de transportes do planeta sem ter um único veículo entre seus ativos, e o Airbnb a maior rede de hospedagem sem possuir um único quarto. Poderíamos questionar se os segmentos alegados são mesmo os dessas empresas, mas vamos por outro caminho… As afirmações são fato incontestável, essas organizações estão entre as maiores do mundo na atualidade. Com esses fatos procuram demonstrar que há uma mudança disruptiva em modelos de negócios tradicionais, onde o modelo das cadeias de produção vigente está dando lugar ao de plataformas de negócios. E é aqui que penso que há uma distorção da realidade ou, no mínimo, meias verdades. Vejamos…

A Amazon vende o quê mesmo? Bens e serviços diversos, produzidos por plataformas ou cadeias produtivas??? E a Uber oferece a possibilidade de transporte (de pessoas ou refeições) por quais meios? Veículos de motoristas particulares, produzidos por plataformas ou cadeias produtivas??? E a Airbnb hospeda pessoas onde? Habitações de proprietários dispostos a ceder seus espaços, construídas por plataformas ou cadeias produtivas???

Embora seja um fato de que algumas das maiores empresas de hoje operem num modelo de negócio baseado em plataformas, que conectam fornecedores e consumidores em rede, elas ainda assim dependem da existência, e talvez só possam existir por isso, de empresas que operam no modelo de negócio das cadeias produtivas. E mais, nem a Amazon destruiu os varejistas estabelecidos, nem a Uber aniquilou as frotas de táxis, e nem o Airbnb liquidou com as redes de hotéis, pousadas e similares. Houve uma acomodação e ajustes entre os players, mas os tradicionais ainda estão por aí firmes e fortes, não ocorreu a destruição criativa de uma disrupção.

Sendo assim, me parece que melhor do que pensar e acreditar que todos os segmentos deverão optar por convergir para o modelo de plataformas de negócios ou morrer, é mais sábio trabalhar com a possibilidade, caso a caso, de convivência harmônica dos dois modelos. Isso amplia as alternativas, a destruição criativa nessa situação dá lugar ao entendimento de que existem espaços inexplorados de mercado, que podem ser mais rápida, econômica e amplamente acessados, com empreendedorismo de inovação (radical, mas não necessariamente disruptiva), por modelos de plataforma de negócios.

Grandes empresas estabelecidas têm trabalhado nessa direção, promovendo programas de parceria com startups, de modo a agilizar a busca por inovações em soluções que possam ser agregadas ao seu portfólio, ou alternativamente serem oferecidas como um algo a mais por meio de parceiros, sem necessariamente abrir mão de seu modelo do core business em cadeia produtiva.

Fica a reflexão!