Antissistema organizacional e os não ditos

O Antissistema Organizacional é a desinteligência sistêmica alimentada por não ditos, atrapalhando e prejudicando a colaboração, o resultado e os relacionamentos. Pessoas produzem não ditos quando, por motivo real ou imaginário, evitam dizer o que está realmente incomodando.

Como detectar a causa dos não ditos? Há insatisfação velada ou  aversão sigilosa na organização? Qual a falha do Sistema que cede espaço ao Antissistema? O que pode ser pensado mas não explicitado? Por quê?

Quando as relações de poder produzem ou encobertam não ditos, perturbam potencialmente toda a organização. O Sistema precisa identificar a desinteligência da gestão, enquanto as pessoas precisam aprimorar o autoconhecimento para se posicionarem com assertividade, evitando cederem ao antissistema.

Qual o impacto do antissistema no seu contexto organizacional?  Qual o nível de autoconhecimento dos líderes?  Inexiste sistema perfeito e as pessoas são as grandes solucionadoras de problemas, mas precisam saber olhar de frente para as causas que, às vezes, são elas mesmas.

Feedback negativo ou educativo?

Quando se dá um feedback com o conteúdo certo e a forma adequada, argumentando com fatos e dados sobre o insuficiente desempenho ou inadequação comportamental  de alguém, inspirando-a a refletir sobre o que foi dito, faz-se uma ação educativa de grande valor.

Chamar este tipo de feedback de feedback negativo, como se evidencia nos registros clássicos sobre o tema, parece equivocado e conduz a um ambiente psíquico também não favorável ao desenvolvimento humano. Antes de tudo, a escolha cuidadosa de palavras é fundamental para ativar o melhor do imaginário das pessoas.

A estratégia de se começar com um feedback positivo não impede a pessoa de preparar-se pelo chamado feedback negativo, fazendo-a iniciar um processo defensivo, até mesmo inconsciente, devido ao que é ativado na mente com a palavra “negativo” incrustada, fatalmente, ao próximo feedback. 

Talvez, a origem da expressão feedback negativo relacione-se ao efeito emocional incômodo, inerente ao descuido da forma adequada de dizer o que precisava ser dito. Infiro que, historicamente, os  feedbacks  ficavam  à mercê do temperamento de quem os dava. Atualmente, basta observar as leis que emergiram para diminuir o problema de abuso de poder ou assédio moral, além da definição de valores organizacionais.

O que a pessoa que recebeu o feedback educativo fará com o que lhe foi oferecido, é livre arbítrio e, dependerá dela crescer ou enfraquecer o vínculo. O imprescindível é que além da forma correta, a intenção de quem dá o feedback educativo seja, fundamentalmente, o desenvolvimento do indivíduo, ele permanecendo ou não na organização.

O Lado Sombra das organizações

A “personalidade” de uma organização é determinada por sua cultura, moldada pelos valores organizacionais quando traduzidos em atitudes e comportamentos esperados de todos os seus membros. Mas a essa “personalidade” organizacional não tem sido dada a necessária atenção. Muitas organizações deixam a cultura organizacional ao sabor das pessoas que por ali vão passando, com consequências adversas à produtividade, à qualidade, ao custo, com que as coisas são feitas.

lado_sombraPor outro lado, chama atenção que uma expressiva quantidade de organizações estabelece lemas sobre seu negócio que refletem o que, de fato, elas deveriam aperfeiçoar em sua “personalidade”. Contudo, essas expressões, acabam servindo ao único propósito de (tentar) promover a organização do ponto de vista do marketing. Se prestarmos atenção ao lema adotado e as ações empreendidas no dia a dia, percebemos que um vai de encontro ao outro, destacando um lado sombrio da organização. Assim, de modo contrário ao almejado, o lema coloca em foco um aspecto crítico, mal resolvido, de seu desempenho. Por exemplo, quando fala em qualidade na prática existe uma quase total falta de atenção a tal da qualidade.

O renomado psiquiatra Jung estabeleceu o conceito Sombra ao se referir ao lado obscuro da personalidade das pessoas. Aquele lado que faz parte do inconsciente do indivíduo, que quando vem à consciência provoca um desconforto. Refletindo sobre a questão dos lemas que escancaram aspectos obscuros das organizações, podemos concluir que, assim como as pessoas, as organizações também têm seu Lado Sombra. Isso faz todo o sentido, afinal o que é uma organização senão um grupo de pessoas trabalhando em conjunto para realizar objetivos coletivos. Então, traçando um paralelo ao conceito Sombra de Jung, poderíamos dizer que o Lado Sombra da organização pode ser pensado como fazendo parte do inconsciente organizacional.

Para ilustrar essa situação, cito três casos exemplares:

Uma organização da área da construção civil adotou o lema “cuidado com cada detalhe”. Contudo, para quem conhece seus imóveis, os tais detalhes são visivelmente descuidados, da falta de ângulos retos em paredes ao desnivelamento de pisos, de esquadrias mal encaixadas a acabamentos grosseiros. Simplesmente não têm qualquer atenção com as coisas mais elementares da construção de um imóvel, muito menos com os detalhes.

Uma empresa da área de tecnologia tem em seu lema “fazer da melhor forma”. Porém, para seus parceiros de negócio, fica evidente que faz muita coisa de forma improdutiva. Há retrabalhos, mau uso dos recursos por falhas no planejamento, falta de definição de prioridades, etc. Ou seja, embora sendo o cerne de seu lema, essa organização aparentemente desconhece o significado do que seria a “melhor forma”.

Uma empresa da área do turismo usa em seu lema a expressão “uma experiência notável”. Mas, muito pelo contrário, parece se esforçar para fazer o cliente lembrar-se de uma experiência sofrível vivenciada ao utilizar seus serviços. Nada acontece, como seria o esperado, conforme a promessa de uma experiência algo memorável. Os atendentes são frios no relacionamento com os clientes, por vezes completamente desatentos a esses, pedidos simples são ignorados ou atendidos de modo equivocado, não há o mínimo cuidado com o conforto dos ambientes, e assim por diante.

Dos exemplos citados, fica evidenciado o Lado Sombra organizacional. As organizações que perceberem isso, que dedicarem verdadeira atenção ao seu Lado Sombra, que muitas vezes acaba explicitado nos lemas que adotam, obterão significativas melhorias em suas atividades e seus resultados, talvez até mesmo vantagens competitivas, ao atuarem para eliminar essa fragilidade.

Caso do SAC: para que serve mesmo???

sacO SAC – Serviço de Atendimento ao Cliente – foi estabelecido para dar acesso aos clientes, particularmente, quando esses necessitam de uma solução para algum problema: um bem que apresenta mau funcionamento ou um serviço mal prestado. Não só para isso, mas também para eventuais esclarecimentos sobre o funcionamento do bem ou do serviço, que não ficaram claros na aquisição ou uso. Mas, em muitas situações, parece que as empresas encaram o SAC como um serviço de “afastamento” do cliente, uma tentativa explícita de fazer com que o cliente desista do acesso, se esqueça de sua reclamação… Vejamos, por exemplo, os seguintes casos:

SAC de uma Cia Aérea: você adquiriu uma passagem, mas por um motivo qualquer precisa alterar o horário do voo. Liga para o SAC, com essa intenção, e é atendido com uma mensagem padrão. Você então começa a ouvir informações sobre as quais simplesmente não quer ou precisa saber, algo do tipo: “Aproveite nossas ofertas desta semana, acessando nosso site www… Você pode realizar seu check-in pela web, com agilidade e sem precisar entrar em filas, bastando acessar nosso site e clicar em web check-in. Lembre-se de que para viagens nacionais você deve estar no aeroporto com uma hora de antecedência do horário do voo, e para viagens internacionais…” E assim segue até que, após diversos preciosos minutos de seu tempo e paciência, o sistema o encaminha para as opções de serviço disponíveis, onde você poderá selecionar a opção de atendimento sobre sua viagem.

SAC de uma Assistência Técnica: você tem um equipamento que apresentou algum defeito. Então, acessa o site do fabricante, procurando por um canal de assistência técnica, e encontra uma página onde pode deixar uma mensagem sobre seu problema com a promessa de um retorno com encaminhamento de uma solução. Lá você deve informar seus dados (nome, endereço, telefone, e-mail), dados do equipamento (modelo, local e data de compra,…) e registrar o problema. Faz isso, e ao clicar em enviar recebe a informação de que sua mensagem foi enviada e que alguém entrará em contato com você dentro de até 24 horas. Pacientemente aguarda as 24h, 25h, 30h, 48h, …, mas nada acontece, não há qualquer retorno. Então você volta ao site, procura por um telefone de contato e, se o encontra, liga informando o ocorrido, quando o atendente muito gentil, mas sem qualquer forma de encaminhar um atendimento técnico imediato (dado que o prazo de espera já venceu), o informa: “Entendo Sr.! Deve ter ocorrido algum problema com seu registro, mas já anotei tudo e peço que o Sr. aguarde até 24 horas para que alguém da assistência técnica lhe dê um retorno”.

Poderíamos citar diversos outros casos similares, pelos quais aparentemente o SAC foi desenhado para “afastar” o cliente do fornecedor. No primeiro caso, na mensagem padrão, a expressão “… economizando tempo e sem precisar entrar em filas…” parece um contrassenso na medida em que as informações apresentadas não solicitadas colocam o cliente em uma fila de espera por atendimento e o fazem perder tempo, ou não? Além disso, “Aproveite nossas ofertas…” é um evidente oportunismo da empresa, que faz uso indevido de uma ligação originada de um cliente, para tentar lhe vender algo antes de lhe dar atenção e priorizar a solução de seu problema. No segundo caso, mais uma vez lhe pedem 24 horas de espera… dá para confiar que dessa vez vão cumprir com o prometido?

Parece que para esses fornecedores, o cliente é encarado como alguém que atrapalha seus negócios, fazendo-os ter gastos com atendimentos que só tomam tempo e consomem recursos… A sensação que fica é a de que, afinal, como o produto já foi adquirido ou o serviço já foi prestado, o ganho do negócio já foi realizado, então tudo o mais é “custo” a ser evitado.

Outro aspecto altamente questionável dos SACs é sua aplicação indevida. Algumas empresas, aproveitando o contato de um cliente, fazem uso oportunista do sistema para tentar lhe vender algo, antes de priorizar a atenção e solução para seu problema, esse sim o real, e único, motivo de existência do serviço.

Independentemente da existência de Lei regulamentando a operação do SAC, com parâmetros de atendimento (acesso, celeridade, resolutividade, etc.) explicitamente definidos, as empresas deveriam encarar o SAC como um canal de franco relacionamento com o cliente e uma oportunidade de aprendizagem. Todo gestor, no sentido pleno do termo, sabe que processos (e, consequentemente, seus produtos – bens ou serviços) estão sujeitos a falhas, por mais bem desenhados que sejam e preparados que estejam seus executores. Então, entendendo isso, deveriam estabelecer o Serviço de Atendimento ao Cliente – este a razão de ser de suas organizações –, como um resoluto serviço ao cliente. Além disso, deveriam encarar o SAC como um canal de aprendizagem organizacional, uma fonte rica de informações para aperfeiçoar seus bens, serviços e processos. Fica a reflexão, “para que serve mesmo um SAC???”

A quem serve as certificações profissionais?

Como em tudo na vida, também no mundo da gestão empresarial quanto mais simples melhor. A simplicidade amplia a chance de adoção das boas práticas de gestão, tende a evitar problemas decorrentes de burocracia desnecessária, facilita a comunicação entre os gestores e seus interlocutores, entre outros benefícios. Mas simplicidade não pode ser confundida com falta de método, ou falta de qualquer nível de burocracia (existência de regras, documentação de processos e procedimentos, registros, etc.). Nesse contexto, a ação gerencial simples deve ser entendida como objetiva, ágil, com economia de tempo e recursos, que leve a resultados efetivos.

certified_professionalPor outro lado, existe um negócio em franco crescimento, o das certificações profissionais, que parece depor contra a simplicidade. Não que, em certas situações, a certificação não seja desejada, necessária, talvez imprescindível (não é a intenção discutir esse mérito aqui). Mas como regra geral, perseguida por todos os profissionais da gestão que precisam aplicar as boas práticas, ou deles exigida, está mais para uma questão de mercado (leia-se comércio) antes de uma necessidade.

Isso fica bem evidenciado ao olharmos pelo ângulo do campo histórico do uso de boas práticas de gestão, portanto o dos profissionais que as trouxeram até aqui. Por exemplo, na área da gestão de projetos, hoje em dia, ou você é um profissional certificado ou não é ninguém. Mas a gestão de projetos já existia, e funcionava muito bem quando corretamente aplicada, sem toda a burocracia criada (penso eu) muito mais em nome da certificação do que de uma aplicação eficiente. Do mesmo modo, o gerenciamento de processos, uma expressão moderna para o chamado gerenciamento da rotina consolidado com o movimento da Qualidade Total ainda no início dos anos 60 do século passado, entrou na pós-modernidade como Business Processes Management (BPM) e parece que vai indo pelo mesmo caminho de burocracia exagerada, completamente desnecessária para sua efetiva aplicação, mas muito conveniente ao processo da certificação profissional.

Obter uma certificação implica, no mínimo, submeter-se e ser aprovado em algum tipo de exame. Em muitos casos, se ainda não em todos parece que essa é a tendência, antes de se submeter ao exame os candidatos – mesmo aqueles com vasta experiência comprovada na área – devem frequentar um curso (normalmente ministrado pela entidade certificadora). Henry Mintzberg, referenciado especialista em gestão empresarial, costuma dizer que não se aprende gestão em sala de aula, mas sim pela prática. Levando essa afirmação ao nível do negócio de certificações, do mesmo modo, é possível afirmar que não se aprende a aplicar boas práticas de gestão em manuais (books of knowledge) ou cursos preparatórios para certificações.

Claro que o conhecimento sobre ferramentas e métodos gerenciais pode e será compartilhado a partir de manuais e em sala de aula ou outros fóruns de troca de experiências. Contudo, não basta o conhecimento (atestado por um certificado), esse deve somar-se a habilidades na aplicação do ferramental técnico, o que se dá com a prática repetitiva. E mais, também não basta dominar técnicas, há que se desenvolverem habilidades interpessoais, competências comportamentais, como comunicação assertiva, capacidade e curiosidade investigativa, tolerância e jogo de cintura diante de resistências, “malandragem” (no bom sentido) para ajustar a ferramenta ao caso, imprescindíveis em certas situações, o que só vem com o exercício recorrente e o enfrentamento de situações adversas.

O que quero enfatizar com esta discussão, provocada pela questão inicialmente colocada “A quem serve as certificações profissionais?”, é que a ênfase não pode recair sobre os meios, mas sim sobre o fim, sobre o resultado a ser obtido com uma aplicação produtiva das boas práticas. Os meios, particularmente num ambiente de competição extrema, precisam ser eficientes. Ou seja, devem atender a aspectos de menos burocracia, menos gasto de tempo, menos ocupação de pessoas, facilidade de documentação, e por aí afora. Mas tenho a percepção de que em nome da certificação, muita burocracia desnecessária tem sido criada… Ou não??? Fica a reflexão…