Fundamentos da excelência em gestão

Relembrando o arcabouço da gestão empresarial, mais especificamente o know-how sobre gestão, precisamos aprofundar o estudo sobre o primeiro dos três pilares desse know-how, o dos princípios. Também conhecidos por fundamentos (da excelência) da gestão, esses princípios são essenciais para a seleção e correta aplicação das técnicas e dos veículos de gestão (os outros dois pilares). Para isso, para um olhar mais detalhado sobre esses princípios, faço uso dos fundamentos da excelência em gestão, conforme preconizados pelos principais modelos de referência sobre excelência em gestão, como o modelo americano (Baldrige Criteria for Performance Excellence) e o modelo brasileiro (Modelo da Excelência em Gestão – MEG).

A lista de fundamentos que aqui apresento não pretende esgotar as possibilidades, mas não há muito o quê inventar sobre ela. Também é importante destacar que não há precedência deste sobre aquele fundamento, embora alguns complementem e/ou facilitem a aplicação de outros. Vamos aos fundamentos (princípios) e sua explicação objetiva…

Pensamento sistêmico: Entendimento das relações de interdependência, internas e externas à organização, promovendo consistência no desenho dos processos e suas métricas e nos planos de ação.

Aprendizado pessoal e organizacional: Reflexão, avaliação e compartilhamento de experiências no estabelecimento sistemático de novos patamares de conhecimento para a organização, facilitando a melhoria contínua e inovação.

Cultura de inovação: Geração de diferenciais competitivos, pela promoção de um ambiente favorável à criatividade e à experimentação de novas ideias, levando a mudanças significativas em processos, produtos e modelo de negócio.

Liderança visionária: Líderes promovendo a cultura da excelência, relações de qualidade e proteção aos interesses das partes afetadas pelo negócio, com uma atuação participativa, inspiradora e motivadora.

Orientação por processos e informações: Compreensão, integrada e articulada, sobre o conjunto das atividades da organização que geram valor para as partes interessadas, com tomada de decisões com base em dados & fatos.

Foco no futuro: Busca da perenização do empreendimento, pela compreensão inequívoca dos fatores (internos e externos) que o afetam no curto e no longo prazo e o estabelecimento de compromissos de longo termo com todas as partes interessadas.

Foco nos resultados e Geração de valor: Entrega de resultados (ofertas prometidas) consistentes com as necessidades e demandas das partes interessadas, e que sejam sustentáveis a médio e longo prazo.

Valorização das pessoas e parceiros: Estabelecimento de relações fortes com as pessoas da organização e parceiros de negócio, de modo a maximizar seu desempenho e empreendedorismo, potencializando as competências da cadeia de valor e buscando benefícios para todas as partes envolvidas.

Conhecimento sobre o cliente e o mercado: Entendimento sobre o cliente e o mercado, de modo a promover soluções de valor que gerem maior competitividade e sustentabilidade para o empreendimento.

Responsabilidade social: Atuação ética e transparente da organização, gerando benefícios e bem estar sustentáveis para a sociedade, com modelo de atuação que preserve a segurança e a saúde pública e o meio ambiente, respeitando a diversidade e promovendo a redução das desigualdades sociais.

Embora estáveis, como deve ser para que as boas práticas de gestão possam estar bem fundamentadas, esses princípios sofrem, de tempos em tempos, algum ajuste ou acréscimo. Por exemplo, é assim que da lista aqui apresentada, se fizermos uma breve pesquisa histórica veremos que, em sua origem não existia, pelo menos de forma explícita, o fundamento da responsabilidade social. Como essa é uma demanda cada vez mais presente, nada mais justo que fosse tratada como um dos princípios da excelência em gestão. Com certeza, daqui a algum tempo, outros fundamentos emergirão, mas sem invalidar os já estabelecidos, que na melhor das hipóteses podem ser atualizados com aperfeiçoamentos em seus conceitos.

Valores, a base da Cultura Organizacional

A cultura organizacional pode ser entendida como a “cola” que mantém a unidade da organização. De modo geral, a base da cultura organizacional vem da explicitação de seus valores: no que a organização acredita! E, a partir daí, quais são suas predisposições e respectivas ações comportamentais.

Como indivíduos sociais, as pessoas assumem posturas, decidem e (re)agem fundamentadas em seu conjunto de crenças e valores, seus princípios morais. Isto acontece de modo inconsciente: não precisamos parar e pensar antes de decidir e agir, nosso comportamento é quase que totalmente espontâneo. Nossos princípios morais são tão arraigados em nossa mente que ditam todas as nossas atitudes (predisposições) e comportamentos (ações) perante as mais diversas e distintas situações a que somos expostos.

Entendendo que uma organização nada mais é do que uma associação de indivíduos, pode-se concluir que ela (a organização, representada pelo conjunto de pessoas que a compõem) também assume posturas, decide e (re)age de acordo com um determinado, e muitas vezes inconsciente, conjunto de crenças e valores. Aqui pode residir a chave do sucesso ou fracasso dessa organização. Por quê? Os princípios morais (os códigos de conduta) das pessoas são individuais, assim, mesmo compartilhando valores comuns, é fácil perceber que outros (ainda que poucos) serão distintos. Portanto, conflitos serão inevitáveis se não houver uma convergência dos códigos de conduta dos membros de uma mesma organização. Isto se torna ainda mais crítico quando as divergências estão nos sócios do empreendimento: para evitar conflitos, decisões importantes ou são postergadas ou, pior ainda, deixam de ser tomadas.

Como convergir se nossos princípios (individuais) são tão profundos e inconscientes? Esta tarefa cabe aos líderes empresariais. Primeiramente eles precisam reconhecer suas próprias crenças e valores, eventuais divergências, e as consequências positivas e negativas para o negócio. Em seguida, devem convergir entre si, estabelecendo em consenso um conjunto abrangente e coerente de valores para o empreendimento. Por fim, a parte mais difícil, levar estes valores aos demais membros da organização. Como? Vivenciando os valores no dia a dia, explicando-os a todos os envolvidos (funcionários, e até mesmo fornecedores e clientes), agindo de acordo e apontando e corrigindo ações contraditórias ao conjunto de valores organizacionais.

Mas que tipo de valores são importantes para o negócio? É possível distinguir pelo menos dois grupos: o dos princípios morais e o dos princípios de gestão. Por princípios morais vamos entender aqueles valores (juízos de apreciação referentes à conduta humana) que moldam as atitudes e comportamentos do indivíduo em todas as situações de sua vida. Por princípios de gestão vamos definir aqueles valores (fundamentos de excelência) que moldam as decisões gerenciais e ações profissionais, ou seja, as atitudes e comportamentos perante situações envolvendo clientes, fornecedores e colegas de trabalho, no ambiente dos negócios. Exemplificando: um princípio moral comumente encontrado é “honestidade” (integridade de caráter, decoro); por sua vez, um princípio de gestão muito difundido é “qualidade” (atributo do bem ou serviço, adequação ao uso, conformidade com as especificações). Os princípios morais são mais abrangentes, agindo sobre os princípios de gestão: “Sendo honestos, não deixaremos que produtos com pequenas imperfeições cheguem aos nossos clientes.”

Só com valores explicitados, plenamente entendidos por todos e vivenciados no dia a dia, a empresa conseguirá estabelecer uma cultura organizacional forte, que molde as atitudes e comportamentos dos envolvidos com o negócio, privilegiando bons inter-relacionamentos, abertura a mudanças, busca de consenso, enfim, um ambiente propício ao sucesso.

Inovação de modelo de negócio: modelo dos 9 blocos

Segundo Alex Osterwalder, um modelo de negócio pode ser mais bem descrito a partir de 9 blocos que mostram como a organização pretende auferir ganhos. Esses 9 blocos abrangem as quatro principais áreas de um negócio: clientes, oferta de produtos, infraestrutura e viabilidade financeira. A ideia central por trás do modelo sugerido é que seja simples, relevante e intuitivo, de modo que todos possam entender, tornando objetiva a descrição do negócio e sua discussão. Assim, a manipulação do modelo de negócio fica facilitada, permitindo a criação de novas alternativas estratégicas e inovação do negócio. Os 9 blocos do modelo, estruturalmente esquematizados no “Quadro do Modelo de Negócio” ao lado, são:

Segmentos de Clientes: por este bloco se definem os diferentes grupos de pessoas ou organizações que o empreendimento quer alcançar e servir. Esses grupos, segmentos, devem estar associados por necessidades comuns, comportamentos comuns, ou outros atributos. Esses grupos serão segmentos diferentes se suas necessidades exigem ofertas distintas, são atendidos por diferentes canais de distribuição, exigem diferentes formas de relacionamento, apresentam oportunidades de ganhos muito diversas, e estão dispostos a pagar por aspectos diferentes da oferta.

Proposições de valor (oferta): aqui serão estabelecidos os grupos de produtos (bens e/ou serviços) oferecidos que criam valor para determinados segmentos de clientes. Esses grupos de produtos têm como objetivo resolver um “problema” do cliente ou atender a sua necessidade. Algumas propostas de valor serão inovativas representando uma oferta nova ou disruptiva; outras serão similares a ofertas existentes no mercado, mas com alguma característica ou atributo novo.

Canais: este bloco descreve como a organização alcança cada segmento de clientes, de modo a entregar suas propostas de valor. Basicamente descreve os canais de comunicação, distribuição e vendas.

Relações com os clientes: neste bloco serão estabelecidas as formas de relacionamento com os diversos segmentos de clientes. Esses relacionamentos podem ir de relações pessoais a automatizadas, e serão impulsionados pela necessidade de promover ou reforçar vendas e para a retenção de clientes.

Fluxo de ganhos: este bloco representa a geração de caixa do empreendimento, para cada segmento de clientes. Cada fluxo de ganhos pode conter diferentes mecanismos de preços (lista de preços fixos, condições negociáveis, leilões, etc.). O modelo de negócio pode desenvolver duas formas de fluxo de ganhos: pagamento único ou pagamentos recorrentes.

Recursos chave: com este bloco ficam explicitados os ativos necessários para que as proposições de valor possam ser entregue aos segmentos de clientes, representando os meios pelos quais o negócio cria as ofertas (propostas de valor), chega aos mercados, mantém relacionamento com os clientes e obtém ganhos. Os recursos podem ser físicos, financeiros, competências ou pessoas, e podem ser próprios, arrendados ou adquiridos da rede de parceiros.

Atividades chave: neste bloco são definidas as mais importantes ações que o empreendimento deve realizar para que o modelo de negócio funcione. Juntamente com os recursos chave, são as atividades que o negócio precisa para criar as ofertas (propostas de valor), chegar aos mercados, manter relacionamento com os clientes e obter ganhos.

Rede de parceiros (relações chave): por este bloco se estabelece a rede de fornecedores e parceiros que permitem ao modelo de negócio funcionar. De modo geral, podem existir quatro diferentes tipos de parceria: aliança estratégica entre não competidores ou entre competidores, joint venture para desenvolvimento de novos negócios, ou parceria comprador-fornecedor para garantir suprimentos confiáveis.

Estrutura de custos: com este bloco são descritos todos os custos incidentes sobre o modelo de negócio. Esses custos serão mais facilmente determinados após a definição dos recursos chave, das atividades chave e das relações chave (rede de parceiros).

Excelência em gestão empresarial

Para conceituar o que se entende por excelência em gestão, vou usar como referência o Modelo de Excelência da Gestão (MEG) brasileiro adotado pela Fundação Nacional da Qualidade (FNQ) – uma instituição sem fins lucrativos com a missão de “estimular e apoiar as organizações para o desenvolvimento e evolução de sua gestão…” – e o modelo americano Baldrige Criteria for Performance Excellence, que no início da década de 90 foi tomado como base para a estruturação do modelo brasileiro.

Excelência em Gestão EmpresarialExtraída dos primórdios do modelo Baldridge faço uso da figura ao lado, com uma leitura adaptada e simplificada. Essa figura representa os elementos da excelência em gestão e suas inter-relações: missão & visão organizacional, os canais da gestão: estratégia, pessoas, operações, informação, e seus resultados. E do modelo MEG faço uso dos princípios nucleares da excelência em gestão.

Como podemos ver na representação esquematizada pela figura, a essência da excelência em gestão está no cumprimento da missão organizacional e na realização de sua visão de futuro. Isso aparece representado como um guarda-chuva que abarca tudo o que acontece na organização (os canais de gestão inter-relacionados e seus resultados). A partir dessa compreensão, percebe-se que os resultados da organização só virão se houver uma estratégia definida, uma operação encaixada, pessoas habilitadas e informação relevante organizada e disponível.

Pelo canal da Estratégia, uma gestão de excelência se inicia com uma Liderança capaz de traçar as Estratégias e Planos organizacionais, que levem à agregação de valor aos Clientes e à Sociedade.

Pelo canal das Pessoas, a gestão de excelência implica garantir que as Pessoas da organização tenham as competências e habilidades exigidas ao desempenho de suas atividades, tenham atitude proativa e coerente com as necessidades organizacionais, possam estar motivadas num ambiente que privilegie o pleno uso de suas capacidades e passem por atividades organizadas de desenvolvimento de novas capacidades.

Pelo canal das Operações, a excelência em gestão passa por Processos bem definidos, mapeados, documentados, que sejam seguidos pelas pessoas que os executam e sistematicamente revisados com foco em sua melhoria contínua, e que os recursos necessários a sua boa realização estejam disponíveis.

E, pelo canal da Informação, a gestão de excelência promove a organização, difusão e utilização de Informações e Conhecimento necessários à definição das prioridades, à avaliação de resultados e tomada de decisão, à adoção das boas práticas conhecidas e compartilhamento das lições aprendidas.

Por sua vez, os Resultados de uma gestão de excelência devem demonstrar que os Resultados almejados, previamente planejados, estrategicamente e operacionalmente falando, foram alcançados e que são compatíveis com os níveis de competitividade exigidos e com as necessidades dos clientes.

Os grifos (negritos) se referem ao que os modelos de excelência em geral denominam Critérios de Excelência, categorias a partir das quais são avaliados os níveis de excelência da gestão pela análise das práticas adotadas pela organização.

Complementando o entendimento da excelência em gestão, lembrando-nos do pilar dos princípios do arcabouço da gestão empresarial (abordado em ensaio anterior), a seleção das boas práticas de gestão (que, organizadas em meios de aplicação, levam à excelência) deve estar fundamentada em princípios de gestão, que os modelos de excelência aqui tomados como referenciais denominam Valores e Conceitos Essenciais ou Fundamentos de Excelência. Esses princípios, valores ou fundamentos, via de regra, abrangem sem se restringir a: pensamento sistêmico, aprendizado organizacional, cultura de inovação, liderança visionária, constância de propósitos, orientação por processos e informações, foco no futuro, geração de valor, valorização das pessoas e parceiros, conhecimento sobre o cliente e o mercado e responsabilidade social. Num próximo ensaio vou abordar com mais detalhes cada um desses princípios de gestão ou fundamentos de excelência (em gestão)…

Missão organizacional

Logo após a definição do negócio, a Missão da organização deve ser estabelecida num processo de ampla discussão considerando todas as partes interessadas. Ela servirá para que todos tenham a mesma percepção do significado e da finalidade do empreendimento, garantindo foco e coerência de ações.

A definição da missão passa pela resposta a quatro questões fundamentais:

  • O que fazemos?
  • De que modo fazemos?
  • Para quem fazemos?
  • Qual o nosso desafio?

O que fazemos? Essa pergunta se refere ao negócio em si (já definido) e serve para esclarecer qual é a finalidade básica do empreendimento. Como já vimos, o negócio pode ser expresso por uma palavra ou expressão simples, e a consideração de sua amplitude. Por exemplo, no caso de um fabricante de veículos, uma forma restrita seria “automóveis” e uma forma ampla “meios de transporte”.

De que modo fazemos? Essa questão complementa a anterior (o que fazemos?) ao deixar claro como a finalidade básica é realizada. Por exemplo, ainda no caso de um fabricante de veículos, respostas possíveis seriam “com agilidade”, “com uma ampla gama de produtos”, “com uma ótima relação custo-benefício”, etc.

Para quem fazemos? Aqui o objetivo é esclarecer o público-alvo dos produtos (bens e/ou serviços) oferecidos. Também é possível uma resposta mais ampla, definindo não só os clientes focais, mas também as demais partes interessadas. No caso de um fabricante de veículos, por exemplo, as respostas poderiam ser “para as diversas classes sociais”, “para o público V.I.P. (Very Important People)”, “para frotistas”, etc.

Qual o nosso desafio? Responder a essa questão é procurar elucidar, já na declaração de missão, qual o diferencial básico advindo da atuação da organização. Nem sempre essa é uma resposta simples, pela própria provocação que trás à discussão. Como exemplo, ficando ainda num fabricante de veículos, poderíamos ter como resposta “inovação”, “antecipação ao mercado”, “o melhor preço”, etc.

Essas questões normalmente são respondidas num processo de brainstorming (tempestade de ideias), com o envolvimento dos atores principais (stackholders, partes interessadas): dirigentes e gestores, staff de direção e convidados especiais (representantes dos funcionários, dos clientes, dos fornecedores e parceiros do negócio). Num primeiro momento elas podem ser respondidas individualmente, para em seguida, numa sessão conjunta de brainstorming as respostas individuais serem apresentadas, discutidas e consolidadas. Então, desse debate, pode-se extrair os pontos principais (destacados pelo grupo), que vão compor a frase que traduz a missão com a seguinte “fórmula”:

O que fazemos?  +  De que modo ?  +  Para quem ?  +  Qual o desafio?

A declaração final de missão não precisa, obrigatoriamente, ser constituída pelas respostas a todas as quatro questões que servem de base à sua elucidação, mas ao se fazer isso fica muito mais fácil escrever uma missão que traduza de modo claro, amplo e ao mesmo tempo objetivo, a missão organizacional.